Para celebrar o Dia Internacional da Mulher, comemorado em 8 de março, o Instituto Athenas fez um breve levantamento sobre as mulheres e a educação no Brasil, também entrevistou a deputada estadual do Paraná, Ana Júlia Ribeiro (PT-PR), a respeito do tema, já que a parlamentar, além de ativista da educação pública, ganhou destaque, em 2016, durante as ocupações secundaristas que se posicionavam contra a reforma do Ensino Médio.
Dentro do contexto brasileiro, até meados do século XVIII, era relegado às mulheres uma educação superficial e simplista voltada principalmente para o ensino religioso católico e para a alfabetização. Mesmo com uma cultura formal bem consolidada, os interesses vigentes na época impediam que as mulheres tivessem acesso à essa cultura, pois “menina que sabe muito é mulher atrapalhada. Para ser mãe de família, saiba pouco ou não saiba nada”. Esse dito popular sintetiza bem o papel esperado das mulheres dentro daquela sociedade. Poucas eram aquelas que conseguiam romper com o status quo e virar exceção à regra.
Além das restrições para receber educação, havia restrições ao educar alguém. Professoras só podiam lecionar sobre assuntos previamente permitidos e para meninas, ou seja, meninos não eram instruídos por mulheres. Felizmente, por um lado, no campo da educação, hoje, o cenário é diferente. Com a abertura das Escolas Normais, ocorreu uma substituição da mão-de-obra masculina pela feminina. A sociedade passou a enxergar a educação escolar como um prolongamento das funções maternas e por isso as mulheres ficaram nesse espaço.
Sobre o papel das mulheres dentro da educação, principalmente infantil, a deputada Ana Júlia comenta que essa “atividade de cuidados é automaticamente incutida às mulheres, e sua execução é atrelada a ideia da experiência da mulher, uma ideia desenvolvida a partir da divisão sexual do trabalho que coloca as mulheres como cuidadoras natas.”. Para elucidar melhor a questão, ela aponta que, no Paraná, por exemplo, apesar de serem vistas como educadoras, as professoras são consideradas “incapazes” pelo governo de “exercer um papel disciplinador nos estudantes”. Ela cita o modelo das escolas cívico-militares que prefere contar com homens em seu corpo docente “para disciplinar as crianças, um conceito de educação que não preza pela educação libertadora e emancipadora”.
Ao questionar a deputada sobre como lidar politicamente com essa “inversão” profissional nos quadros escolares, que se mantém até os dias atuais especialmente na educação infantil, devido a esse “prolongamento das funções maternas”, de forma a evitar a feminilização ou masculinização das profissões, ela aposta na representatividade como ferramenta para a educação de meninas e meninos.
“Precisamos falar para as nossas crianças que elas podem acessar qualquer profissão e espaço independente do gênero. Precisamos transmitir isso na TV, nas propagandas do governo e dentro da sala de aula trazendo figuras emblemáticas que subverteram esse conceito. Tudo isso é possível a partir de políticas públicas comunicacionais, afirmativas e de garantias da participação feminina e da visibilidade das mulheres”, defende Ana Júlia.
Uma figura muito importante no campo da educação foi a professora Anália Franco (1853-1919). Ela se formou aos 16 anos e passou a trabalhar no interior de São Paulo com crianças abandonadas na roda dos expostos. Em um país escravocrata como o Brasil, enfrentar as questões raciais era um ato de rebeldia e Anália, que era uma mulher branca, não hesitou em permitir que alunos brancos e negros frequentassem juntos as suas aulas.
Em 1901, a professora fundou a Associação Feminina Beneficente e Instrutiva do Estado de São Paulo, que tinha como objetivo amparar e educar crianças carentes. Essa iniciativa permitiu que ela expandisse suas pretensões para além da educação formal. Foram executadas atividades que angariavam recursos financeiros para viabilizar que outras instituições com os mesmos objetivos pudessem ser abertas em outras partes, não só em São Paulo, mas no Brasil inteiro.
Recentemente, de acordo com o IBGE, há uma tendência geral no aumento da escolaridade das mulheres em relação aos homens, porém, esse quadro não se reflete em melhores condições e oportunidades para as mulheres no mercado de trabalho. Ao colocar esse cenário, Ana Júlia é categórica ao dizer que o definidor do local da mulher dentro do mercado de trabalho é o capitalismo. Esse sistema econômico dificultaria pensar no tema a partir de uma questão meritocrática “numa perspectiva de merecimento dentro de uma lógica capitalista e machista do trabalho”.
Para abordar a questão sob a perspectiva das políticas públicas, inicialmente “é necessário que se discuta uma lógica de paridade mais objetiva que garanta a participação das mulheres nos cargos de mando e gestão”, então, somente a partir desse ponto é que seria possível desenvolver ações governamentais, de modo geral “criar incentivos e isenções fiscais para empresas que garantem políticas de igualdade de gênero”, acrescenta a ativista.
A deputada alega que “a discriminação das mulheres no mercado de trabalho reflete a imposição de papeis sociais e culturais às mulheres como as principais responsáveis pelos cuidados familiares e pelos trabalhos domésticos. E, quando se fala de trabalho de cuidado remunerado, as mulheres são muito mal remuneradas”.
Além disso, ela destaca algumas medidas que já foram sancionadas em 2023, durante a gestão do atual presidente, que visam garantir a igualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho, como a política de equidade salarial. ”Porém para que a equidade seja alcançada, é necessário que haja uma conscientização popular sobre a situação das mulheres não apenas no mercado de trabalho, mas na sociedade como um todo”, ressalta a ativista.
Escrito por:
Isabela Gusmão
Coordenadora Jornalística do Instituto Athenas
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